sábado, 15 de fevereiro de 2014

As maiores tosquices das novelas



Novela é inverossímil desde sempre. A maior parte das reclamações são de quem odeia novela ou quer pagar de intelectual. Prova disso são as implicâncias com a diferença de idade de Julia Lemmertz e Natália do Vale em "Em Família", e da atriz Karen Coelho interpretar uma personagem mais velha em "Além do Horizonte". Mas o Besteiras Bestificantes trouxe os casos mais loucos de escalações de personagens.

Yoná Magalhães japonesa


Da esquerda pra direita: Carlos Alberto, Yoná Magalhães e Mário Lago


Sim senhor. Isso ocorreu há quase 50 anos, na novela das 8 "A Sombra de Rebecca" (1967). Naquele tempo, boa parte das novelas se passava em países distantes, com protagonistas estrangeiros, e os roteiros eram adaptações de peças de teatro e de romances. E a autora mais badalada daquele tempo era Glória Magadan (1920-2001), que deve ter inspirado a autora Glória Perez na escolha de suas tramas mirabolantes.
A novela contava a história de Sir Phillip (Carlos Alberto), um aristocrata inglês que vivia feliz e sossegado em Tóquio com a sua esposa Rebecca (Neuza Amaral) e seu filho Carlinhos (Antônio Dresjan). Até que, num acidente de avião, Rebecca é dada como morta e Phillip, sozinho e carente, acaba se engraçando com a japonesa Suzuki, personagem da brasileiríssima Yoná Magalhães. Bom, naquele tempo, o pessoal não tinha muito critério na escolha dos atores, pegava qualquer um e pronto. Ocorreu a mesma coisa com os outros personagens japas da história: o pai de Suzuki, Tamura, era vivido pelo saudoso carioca da gema Mário Lago (1911-2002), e o prometido de Suzuki, Koburi, era o gaúcho Ênio Santos (1922-2002).
Bom, no final, a Rebecca acaba voltando, o Phillip fica todo feliz e a Suzuki, no auge de sua dor de cotovelo, acaba praticando haraquiri, ou seppuku (ritual japonês de suicídio). Até na hora de se matar, os japoneses têm ritual!

Outro japa brazuca




O costume de colocar brasileiros pra interpretar japoneses continuou nas novelas por um tempinho. Dessa vez, o paulista Edney Giovenazzi foi o escolhido. Ele deu vida ao tintureiro Mario Yamashita na novela A Próxima Atração (1970). Pra vocês, ele convenceu melhor do que o Mário Lago e a Yoná Magalhães?

Indianos com sotaque carioquêix

Carlos Alberto e Yoná Magalhães, os cidadãos do mundo


Não, não estamos falando de "Caminho das Índias" (2009), que levou um Emmy de melhor novela. Estamos falando de "O Homem Proibido" (ou "Demian, o Justiceiro"), de 1967. A novela também era de Glória Magadan e os personagens eram, em sua maioria, indianos ou ingleses. Contava a história de Kim (Carlos Alberto), que foi destronado ainda menino e voltou, com o pseudônimo de Demian, pra se vingar da galera. Cheia de nomes complicados, dificilmente faria sucesso hoje em dia. Essa novela também tinha Yoná Magalhães, Mário Lago, Emiliano Queiroz,  Marieta Severo, Paulo Gracindo (1911-1995) e Cláudio Cavalcanti  (1940-2013) interpretando indianos.


Beatriz Segall pobretona



Quem assistiu Vale Tudo (1988) não consegue imaginar a eterna Odete Roitman sendo pobre. Mas, quem assistiu Champagne (1983), sabe do que eu tô falando. A personagem era Eunice, esposa de Camilo (Luiz Carlos Arutin), a quem ajuda como pode no orçamento doméstico. Era uma espécie de Dona Xepa, pois tinha uma filha que tinha vergonha de ser pobre (Eli, vivida pela Lúcia Veríssimo). Mas, no final, a filha rebelde acaba se redimindo e ficando com o galã da trama, o grosseirão Nil (Tony Ramos).

Um ator branco interpretando um personagem negro



O ator era Sérgio Cardoso (1925-1972). A novela era A Cabana do Pai Tomás (1969). E o protagonista? Um escravo negro em busca da liberdade em plena Guerra da Secessão. Até aí, tudo bem, não fosse pelo fato de que Sérgio Cardoso era... branco! Isso gerou a revolta da imprensa, principalmente do ator Plínio Marcos, que escrevia a coluna Navalha na Carne no jornal Última Hora. Para ele, quem deveria ser Pai Tomás era Milton Gonçalves. Porém, a escolha do protagonista não dependia da Globo, e sim de sua patrocinadora, a Colgate-Palmolive, que escolheu Sérgio Cardoso para esse polêmico papel.
Mas essa novela é pouco lembrada por seu feito histórico: foi uma das primeiras a ter uma negra como protagonista!  Tratava-se da grande atriz Ruth de Souza, que foi indicada pelo próprio Sérgio e interpretou Cloé, a esposa do Pai Tomás. Ela sofreu preconceito de outras atrizes brancas e recalcadas que não queriam ficar atrás da protagonista nos créditos. Nessa novela, Sérgio Cardoso também tinha outros personagens: o abolicionista Dimitrius e o presidente americano Abraham Lincoln. 

NOTA: A primeira protagonista foi Clotilde, personagem da atriz Yolanda Braga, da novela A Cor da Sua Pele (1965), e que falava justamente de preconceito racial. A atriz estreou nessa novela, mas não teve muita sorte na carreira.

Atualmente, pelo menos, os diretores se dão ao trabalho de contratar atores negros, orientais ou parecidos com as etnias e idades de seus personagens. Mas, de vez em quando, alguns equívocos aparecem. É nessas horas que a gente pensa no teatro, em que tais práticas são ainda mais comuns e no entanto, ninguém liga.

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